Direito autoral na arquitetura: quem tem direito sobre o projeto?

de Elisângela Dias Menezes

A arquitetura é uma forma de expressão artística e intelectual que pode ser protegida pelo direito autoral. Mas quem tem direito sobre o projeto arquitetônico? Seria o arquiteto, o proprietário ou a construtora?

Esta questão ganhou destaque no ambiente digital com o movimento de blogueiras e vendedoras de roupas, que vêm se utilizando de casas de luxo em São Paulo como cenário para fotos em suas redes sociais.

O problema é que essas casas são projetos de arquitetos renomados que não autorizaram o uso de suas obras como ambiente para publicidade. Alguns desses profissionais vêm ingressando com ações judiciais para defender seus direitos autorais e pedir indenização por danos morais e materiais.

Uma dessas situações envolve a casa de autoria do arquiteto Ruy Ohtake, que fica no bairro Jardins. Ela se destaca pelo formato curvo e pela cor vermelha. De acordo com o site Casa Vogue, a casa foi usada como pano de fundo para fotos de modelos de lojas do Brás, que vendem roupas populares pela internet.

As fotos, divulgadas nas redes sociais das lojas e das modelos teriam gerado indignação do arquiteto, que buscou na Justiça a reparação de seus direitos morais e patrimoniais. Ele pediu que as fotos fossem retiradas das redes sociais e que as lojas e as modelos pagassem indenização e multa.

Outro caso emblemático é o da mansão projetada pelo arquiteto Isay Weinfeld, também no bairro Jardins. Ela tem um estilo moderno e minimalista, com uma fachada branca e um jardim vertical. Segundo o site ArchDaily, a casa foi usada como cenário para fotos de uma marca de tintas, que colocou as imagens nas latas dos seus produtos e em propagandas na mídia.

Também nesse caso, o arquiteto recorreu à Justiça alegando que a casa é uma obra intelectual protegida por direito autoral e que o uso comercial da fachada violou seus direitos morais e patrimoniais. Ele pediu que as imagens fossem retiradas das latas de tintas e das propagandas e que a marca de tintas pagasse indenização e multa.

O que diz o direito?

Em ambos os casos, os arquitetos têm razão em defender seus direitos autorais, pois são os criadores das obras arquitetônicas e têm o direito exclusivo de autorizar ou proibir o uso de suas criações em projetos artísticos de terceiros.

A fotografia publicitária, nesses casos, pode ser interpretada como uma nova obra artística, que promove a incorporação autoral de outra obra intelectual preexistente (fachada arquitetônica), tudo sem prévia e expressa autorização.

Além disso, os arquitetos têm o direito moral de ter o nome indicado como autores e de assegurar a integridade de suas obras, evitando que elas sejam associadas a produtos ou serviços que não condizem com sua reputação ou com sua intenção artística.

De acordo com a Lei 9.610/98, que regula os direitos autorais no Brasil, os projetos, esboços e obras plásticas concernentes à arquitetura são considerados obras intelectuais protegidas, assim como as obras literárias, musicais, audiovisuais, entre outras.

Significa dizer que, legalmente, o arquiteto tem direito exclusivo de utilizar, publicar ou reproduzir sua obra, bem como de autorizar ou proibir sua utilização por terceiros.  Além disso, o arquiteto tem direitos morais sobre sua obra, que incluem o de reivindicar a autoria da obra, o de ter seu nome indicado como autor, o de conservar a obra inédita, o de assegurar sua integridade e o de modificar a obra antes ou depois de utilizada.

Interessante notar que, ainda que o proprietário autorize a produção das fotos, o arquiteto também precisa fazê-lo, por respeito à sua arte incorporada na construção. Este entendimento já foi firmado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em decisões anteriores sobre o tema.

Portanto, o proprietário ou a construtora que contrata o arquiteto para elaborar um projeto não adquire automaticamente os direitos autorais sobre ele. Eles precisam obter uma cessão expressa e por escrito do arquiteto para poder usar a obra. Caso contrário, eles só podem usar o projeto para os fins previstos no contrato e respeitando os direitos morais do autor.

Vale reforçar que o proprietário e a construtora não podem alterar o projeto sem a autorização do arquiteto, nem ceder ou vender o projeto para terceiros, muito menos permitir que a obra seja usada para fins comerciais ou publicitários sem o consentimento do autor.

Quem fiscaliza?

A seu favor, os arquitetos contam com o apoio do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR), órgão responsável por orientar e fiscalizar o exercício da profissão de arquiteto e urbanista no país.

Em matéria de direito autoral, o CAU/BR também oferece aos profissionais inscritos no conselho a possibilidade de registrar seus projetos ou outros trabalhos técnicos de criação intelectual como forma de proteger seus direitos autorais.

Importante frisar que o registro de direito autoral no CAU/BR é facultativo e gratuito, e pode ser feito pelo site do conselho. O registro serve como prova da autoria da obra e da data em que ela foi criada, facilitando a defesa dos direitos do arquiteto em caso de violação.

Diante do exposto, resta claro que o direito autoral na arquitetura é um tema relevante e atual, que merece atenção dos profissionais e da sociedade. Os arquitetos devem estar cientes dos seus direitos e deveres em relação às suas obras, bem como dos meios legais para protegê-los.

Por sua vez, proprietários e construtoras devem respeitar os direitos dos autores dos projetos que contratam ou executam, evitando conflitos judiciais e prejuízos financeiros. Assim, os titulares de obras arquitetônicas precisam ter cuidado ao utilizar as fachadas ou outros elementos estéticos relevantes dessas obras para fins comerciais ou publicitários, pois podem estar infringindo os direitos dos seus criadores.

Finalmente, fica a expectativa de que este texto tenha contribuído para o debate sobre a proteção dos direitos autorais desta importante categoria de criadores intelectuais. Fica também o convite para que todos possam acompanhar o desenrolar desse movimento e seus reflexos na evolução dos direitos autorais dos arquitetos em nosso país.

Veja também:

Proteção autoral via Blockchain: o que você precisa saber

Blockchain – para além das criptomoedas

você pode gostar

Deixe um comentário