Do sucesso meteórico ao desaparecimento. Uma disputa autoral tirou recentemente do ar o hit “Lovezinho”, da cantora brasileira Treyce, que havia viralizado nas plataformas de streaming com a performance do dançarino Xurrasco. Mas, afinal, o que aconteceu nos bastidores jurídicos deste caso? O que ele pode nos ensinar sobre o direito autoral na música?
Em primeiro lugar, vale lembrar que o refrão de “Lovezinho” trazia, em ritmo de arrocha, a melodia de outra composição, “Say it Right”, de Nelly Furtado, editada pela Sony Music. Treyce e o produtor carioca WK, responsáveis pelo hit, chegaram a ser notificados dois meses antes, pela Sony, sobre o uso indevido.
Como a negociação para a devida autorização não evoluiu, a editora de Nelly Furtado reivindicou os direitos autorais, exigindo que as plataformas retirassem a música do ar, naquele momento já com mais de 10 milhões de visualizações.
O tipo de uso autoral que aconteceu neste caso e o seu desfecho podem nos ensinar algumas lições valiosas sobre o direito autoral na música. Vamos a elas?
#1 – Nem tudo que é culturalmente aceito é lícito
Muitos alegam que o que ocorreu no caso de “Lovezinho” foi um “sample” e que, como a prática é recorrente no meio musical, deveria ser aceita. O problema está nas divergências que envolvem este conceito.
Sample, do inglês, significa “amostra”. A técnica de “samplear” ou fazer “sample” se caracteriza pela utilização de uma gravação prévia, que pode ser de instrumentos, sons naturais ou voz, para compor uma canção posterior. Até aí, tudo certo, pois o autor pode compor sua obra em momentos diferentes, agregando elementos diversos para chegar ao resultado desejado.
A questão é que, em uma espécie de “contracultura”, os produtores musicais gradativamente ampliaram por conta própria este conceito, passando a recortar trechos de outras músicas e inseri-los no conteúdo de novas composições. Resultado: sem autorização e sem os devidos créditos, a inclusão da amostra de uma música em outra configura plágio.
Como se vê, não é porque todo mundo faz que se pode fazer. Nem tudo o que a tecnologia possibilita é legalmente permitido, nem tudo o que soa natural no meio artístico tem respaldo jurídico.
#2- Plágio é coisa séria
O plágio pode ser entendido como a cópia disfarçada de trechos de uma obra em outra, levando ao engano quanto à autoria da nova obra, que parece original, mas não é. A prática é considerada como violação de direitos autorais, descrita como crime no Código Penal e como infração autoral, capaz de ensejar indenização por danos morais e patrimoniais.
No meio musical é muito comum ouvirmos uma música que nos remete imediatamente a outra, o que implica em recorrentes denúncias entre os envolvidos e a frequentes disputas e processos judiciais por plágio.
Como a cultura e a criatividade nem sempre são devidamente valorizadas em nosso país, há certa aceitação social quanto à prática do plágio, como se não fosse coisa séria. Será?
O banimento de “Lovezinho” demonstrou que o plágio pode trazer prejuízo à imagem, à fama e ao reconhecimento social do autor/artista, que hoje valem ouro. Sem contar na perda do histórico de visualizações da música e da própria remuneração do streaming.
#3 – Fazer música é coisa de profissional
A jovem autora Treyce, em sua defesa, declarou que não sabia que sua prática “daria problema”. Alegou inexperiência e boa-fé. Em um país que não ensina Direito nas escolas, isso é muito possível, embora não seja desculpável.
O fato é que, em uma sociedade online e em um mercado musical totalmente digital, não cabe mais amadorismo entre os autores, intérpretes e produtores. Todos precisam conhecer as regras do jogo, que passam pela consciência de seus direitos e deveres.
Além do talento e da criatividade, fazer música hoje exige conhecimentos mínimos de gestão, direito e tecnologia. Não é preciso fazer uma faculdade. Há cursos livres, simples e rápidos que podem suprir essa lacuna. (conheça a Powerjus – inserir link)
#4 – Autorização vem sempre antes do uso
Treyce e o produtor MX ainda tiveram uma chance de reverter o erro de estratégia. Ao receberem a notificação da Sony Music, editora da obra original utilizada, poderiam ter sentado à mesa de negociação e pagado pela liberação do trecho da música.
A demora e ausência de resposta devem ter levado Nelly Furtado e sua Editora a crerem que nada seria feito a respeito, o que viola claramente a determinação da lei autoral no sentido de as licenças serem sempre prévias e expressas.
De fato, pela lógica autoral, primeiramente pede-se a autorização para depois se utilizar a música. Se isso não foi feito e se houve uma segunda chance de negociação, o bom senso e a inteligência jurídica advertem no sentido de aceitá-la.
#5 – A negociação é a base de tudo
Em matéria de direito autoral musical, as licenças e cessões de direitos ocorrem entre as pessoas físicas dos próprios autores ou as respectivas pessoas jurídicas, sendo em geral as editoras que os representam. Tudo é feito por escrito, via contrato, em negociações particulares e flexíveis.
Em suma, cada autor é dono de seus “bens imateriais” e sempre dá para reverter uma má impressão ou o uso indevido com uma conversa franca, um pouco de humildade e mediante a compensação mínima pelos danos causados.
Todas as gravações musicais devem passar não apenas pela liberação autoral das respectivas composições, mas também pelas autorizações artísticas de intérpretes e pelos respectivos contratos de produção fonográfica e distribuição digital. Quanto mais documentadas as relações, mais confiável e valoroso o conteúdo comercial gerado.
#6 – Ignorar o direito autoral pode sair caro
Por tudo o que foi dito acima, resta claro que o desconhecimento da lei, das práticas de mercado e das regras de bom senso tem um elevado preço. Ainda que nenhuma indenização seja requerida, todo o trabalho e investimento de divulgação e projeção de carreira se perderam.
Apesar de Treyce ter dito que está tentando reaver a música, o fato é que o histórico de seus 10 milhões de visualizações se perdeu. Faltou o cuidado devido com a gestão da canção que ela diz ser seu maior hit e parte importante de sua história.
Este, como tantos outros erros provenientes do desconhecimento ou da pouca valorização do direito autoral, reafirma aquele velho ditado do “barato que sai caro”. Melhor seria que os autores se ajudassem para que, fortalecidos, pudessem todos lucrar mais com suas composições, valorizando suas obras junto ao mercado.
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