Se você é autor de obras artísticas e culturais e não sabe como registrá-las, você não está sozinho. Muitas são as dúvidas a respeito desse tema.
Elas partem de criadores de obras artísticas reguladas pela Lei nº 9.610 de 1998, a chamada Lei de Direitos Autorais (LDA). Dentre elas:
- textos (incluindo projetos e métodos);
- músicas;
- fotografias;
- desenhos;
- pintura;
- audiovisual.
Entenda, a seguir, um pouco sobre a proteção autoral!
O direito autoral nasce com a obra
Em primeiro lugar, é preciso entender o direito autoral como o conjunto de direitos que o criador tem sobre suas obras artísticas e culturais. Ao contrário do que se imagina, não é preciso registrar uma obra autoral para ser considerado autor.
O Direito de Autor nasce com a própria criação (e exteriorização) da obra. Quando a obra ganha corpo no mundo, em algum suporte ou formato, passa a ter uma existência real. A partir desse momento, ela merecerá a proteção da lei.
Presunção de autoria
Não há necessidade de qualquer registro para a aquisição de direitos autorais. O próprio texto do artigo 18 da Lei Autoral (Lei 9.610/98) dispõe categoricamente que a proteção independe de registro.
De fato, o autor não precisa de documento público ou particular que lhe resguarde a condição de criador. Basta que crie para ser presumido autor. Esse é um dos princípios da lei: presume-se autor aquele que cria e anuncia a sua autoria. Mas se trata de uma presunção relativa, que pode ser derrubada por outro autor. Isso caso ele prove que já tinha aquela obra como sua em data anterior àquela anunciada para a criação.
Anterioridade
A lógica da autoria de obras artísticas é a da anterioridade. Ou seja, quem tem a obra autoral como sua há mais tempo, será considerado o seu criador. Nesse sentido, a atribuição de uma data à criação é essencial. Ela se torna um marco inicial do exercício dos direitos de autor e uma maneira de identificar quem de fato é o criador. Ou seja, aquele que tiver o uso mais antigo associado à obra.
Registro como meio de prova
Embora o registro autoral não constitua a autoria da obra, ele é essencial nessa atribuição de data, a fim de garantir a autoria. Assim, o registro é um importante meio de prova, que, não obstante tenha valor relativo, ajuda a garantir os direitos do autor perante terceiros.
Se o autor se cercar de provas que contenham a data da criação, impedirá que qualquer usurpador se apresente posteriormente como criador da obra. Trata-se de uma garantia aos interesses do autor.
Assim, caso seja questionado em sua condição de criador, o titular poderá apresentar o registro. Ele valerá como documento capaz de vincular a sua autoria a uma determinada data, obrigando que a outra parte prove a anterioridade de uso.
De fato, quem primeiro manifestou a obra no mundo, provavelmente a criou. Não existem criações idênticas e simultâneas. Dois autores, certamente, nunca vão exteriorizar sua expressão artística ou literária por meio de obras exatamente iguais. Isso mesmo que tratem de um assunto semelhante, sob uma mesma ótica e influência.
Haverá sempre gestos, traços, palavras, sons, expressões ou outros elementos distintivos. Quem tardiamente se apresenta como autor, não fará jus a esse título, caso provada a existência anterior da obra pelas mãos de outra pessoa.
Onde registrar as obras e quais são os órgãos tradicionais
O artigo 19 da Lei de Direitos Autorais faculta ao autor registrar a sua obra, mediante solicitação ao que lá se define como “órgãos competentes”. Trata-se de instituições que há anos se prestam a esse papel. No entanto, sem serem oficiais ou exclusivas para essa finalidade.
1. Música
Conforme a natureza da obra intelectual, ela poderá ser registrada em diferentes órgãos. Praticamente, todos eles estão sediados no Rio de Janeiro. As partituras musicais, com ou sem letra, poderão ser registradas na Escola de Música da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
2. Textos e imagens
Livros, revistas, poesias, discursos, roteiros e demais textos escritos poderão ser registrados no Escritório de Direitos Autorais da Fundação Biblioteca Nacional (EDA-BN). Atualmente, a entidade registra também desenhos, fotografias e outras imagens, além de cartazes e até design de website. Eles deverão ser remetidos pelo correio para arquivo e recebimento do protocolo de registro.
3. Pintura e escultura
Por sua vez, a Escola de Belas Artes da UFRJ registra as obras de desenho, pintura, gravura, escultura e litografia. Ela é responsável também pelo registro das obras fotográficas e das produzidas por qualquer processo análogo. Porém, desde que, pela escolha de seu objeto e pelas condições de sua execução, possam ser consideradas criações artísticas. O referido órgão realiza, ainda, o registro de obras de arte aplicada. Para isso, seu valor artístico deve ser dissociado do caráter industrial do objeto a que estiverem integradas.
4. Audiovisual
As obras cinematográficas e demais criações audiovisuais ficam a cargo da Agência Nacional do Cinema — ANCINE. Ela, inclusive, emite para essas obras o Certificado de Produto Brasileiro — CPB.
5. Softwares e aplicativos
Os programas de computador são considerados obras autorais, protegidos por lei própria: a Lei 9.609/98. Ela dispõe que o registro dos softwares poderá ser feito no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), o mesmo que registra as marcas e patentes. No entanto, assim como para as demais obras autorais, o registro é facultativo.
6. Projetos técnicos e profissionais
Por fim, os projetos técnicos, enquanto textos científicos e, portanto, autorais, deverão ser registrados nos respectivos conselhos de classe. Projetos concernentes a Agronomia, Engenharia, Geografia, Geologia e Meteorologia deverão ser registrados no Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CONFEA). Já o registro dos projetos de Arquitetura e Urbanismo fica a cargo do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR).
Quais são outras opções de registro
Para além dos órgãos oficiais de registro, muitos autores relatam interessantes iniciativas para a proteção de sua propriedade intelectual, igualmente válidas enquanto meio de prova relativo. A maioria delas refere-se às letras e partituras musicais, roteiros, argumentos cinematográficos, poesias e demais textos.
O registro de tais escritos em cartório comum, de títulos e documentos, garante a fé pública e atribui uma determinada data às referidas criações. Outra iniciativa é o uso dos Correios, por meio de envio de carta a si mesmo, contendo o documento a ser protegido.
Nesse caso, dois pontos podem ser considerados para fins de prova de anterioridade de uso autoral. O primeiro é o lacre da correspondência, desde que inviolado. Já o segundo, o carimbo dos Correios, atestando a data de recebimento.
O registro por blockchain
Na era digital, o registro autoral também tem ganhado novos contornos. É cada vez mais comum a utilização de redes blockchain para produzir provas de autoria.
A tecnologia pode ser definida como uma cadeia de dados criptografados que circulam na internet de forma descentralizada e inviolável. Ela surgiu para a emissão de criptomoedas, como a bitcoin e o etherium. Porém, o sistema se presta a múltiplas utilizações, dentre as quais se destaca o registro de obras autorais.
Várias empresas brasileiras ligadas à inovação (startups) já oferecem o serviço de registro autoral por blockchain. Avctoris, InspireIP e Authora são alguns exemplos. A própria Câmara Brasileira do Livro passou a oferecer o registro autoral por blockchain. A CBL é o órgão encarregado da emissão de ISBN (código internacional de catalogação dos livros).
Como registrar por blockchain
Os sistemas de registro de obras intelectuais por blockchain utilizam basicamente o mesmo procedimento. O interessado indica o arquivo a ser registrado, que pode ser vídeo, áudio, imagem ou texto, normalmente em qualquer extensão.
Com o arquivo, serão solicitados dados básicos da obra, como autoria e/ou titularidade de direitos, e um breve descritivo do que ela trata. Uma vez preenchidos os dados na plataforma, o interessado paga a taxa cobrada pelo sistema.
Na mesma hora, ele recebe um certificado com o código hash (código de criptografia) de inserção daqueles dados na cadeia de blockchain. Junto a ele, estará o dia e horário em que o registro foi realizado.
Dúvidas e controvérsias do registro por blockchain
Apesar da simplicidade, rapidez e economia do registro por blockchain, no meio jurídico tradicional ainda existe alguma resistência à sua utilização. Isso porque não se trata de um sistema oficial e que ainda não há uma validação desse tipo de prova junto ao Poder Judiciário.
De fato, ainda não há um número expressivo de decisões judiciais que reconheçam os registros autorais por blockchain como prova válida. No entanto, à medida que as tecnologias digitais vão se popularizando, eles se tornarão tendência.
Outra limitação apontada pelos autores a esse sistema é o fato de o conteúdo da obra (arquivo digital) ser criptografado. Dessa forma, se torna inacessível, o que dificultaria o seu reconhecimento para fins de constatação de violação.
Cabe ao autor guardar o certificado de registro com o arquivo, de modo a promover essa associação. Afinal, o certificado sozinho trará de forma visível apenas o nome do arquivo e a declaração de seu conteúdo. De toda maneira, é inegável que o registro por blockchain chega para facilitar, automatizar e popularizar o registro autoral. Especialmente das obras digitais, abrindo novas possibilidades aos autores intelectuais numa sociedade cada dia mais tecnológica.
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