Elis.Adv
  • Home
  • Sobre
  • Atuação
  • Meus livros
  • Blog
  • Depoimentos
  • Contato
Tag:

direito autoral artístico

Tecnologia

Música e pirataria: a cultura que atravessa gerações

de Elisângela Dias Menezes abril 27, 2023
escrito por Elisângela Dias Menezes

Para quem pensa que pirataria de música é coisa da era digital, fica a reflexão: não é à toa que o termo remonta a uma prática de ataques e saques a navios que atravessou os séculos, mundo afora.  Há mais de 100 anos, a prática da pirataria passou a ser associada ao uso indevido de música, sem o respectivo pagamento de direitos autorais. 

Um caso histórico, ocorrido em 1901, costuma ser referenciado como marco inicial desse cenário. Naquele ano, a música “Stars and Stripes Forever”, de John Philip Jones, foi gravada sem autorização e vendida em discos de vinil pela empresa Berliner Gramophone. O autor iniciou uma campanha pública em defesa de seus direitos, acusando a empresa de praticar pirataria autoral.

Mais tarde, a chegada das fitas cassete trouxe um novo desafio. As gravações e reproduções, antes restritas aos estúdios, passaram a ser possíveis pelos usuários.  Surgia a indústria das fitas cassete piratas, com rótulos e faixas copiadas das originais. Surgia, também, a pirataria da radiodifusão, mediante a gravação e comercialização ilegal da programação musical das rádios, que viviam seus tempos áureos.

Na sequência dos acontecimentos, o desenvolvimento da tecnologia passou a permitir a gravação digital de CDs e DVDs. A qualidade do conteúdo cresceu, o controle das cópias se sofisticou, mas novamente a pirataria venceu. Os aparelhos gravadores de CDs se tornaram matrizes de criação de bibliotecas particulares de CDs piratas, não sem muito protesto por parte das gravadoras e outros agentes da indústria fonográfica. 

A popularização da internet, na década de 90, foi a responsável por outra importante virada de chave. Passou a ser possível gravar arquivos de música em mídias móveis, como o pendrive, além da troca e compartilhamento de arquivos entre computadores. 

Em 1999, veio à tona o famoso caso Napster. Ele foi um serviço digital pioneiro no compartilhamento de músicas em formato mp3, de pessoa para pessoa, pelo processo que passou a ser chamado de peer-to-peer (P2P). Tudo isso, sem qualquer tipo de pagamento de direitos autorais. Acusado de pirataria por gravadoras e artistas, em 2001, o Napster sofreu um processo judicial que culminou no encerramento do serviço.

Em 2003, outra novidade estremeceu a indústria da música. O Pirate Bay chegou como um serviço de compartilhamento de arquivos torrent. Por meio dele, os usuários podiam “baixar” (fazer o download) de arquivos de conteúdo, incluindo músicas. Novamente, sem qualquer controle ou pagamento autoral.

O Pirate Bay também enfrentou a fúria das gravadoras e editoras musicais. Elas já sofriam os impactos da nova realidade digital e perdiam investimentos na já condenada indústria das mídias físicas (CDs e DVDs). Em 2009, seus fundadores acabaram condenados a um ano de prisão e ao pagamento de uma multa milionária por pirataria e violação autoral.

De experiências digitais precursoras, como o Napster e o Pirate Bay, surgiu o modelo de negócios do streaming musical. Protagonizada especialmente pela empresa Spotify, a criação da tecnologia permitiu a transmissão da música em tempo real, sem a necessidade de mídia física.

Como a proposta inicial do Spotify era a da oferta de música gratuita aos usuários, a plataforma, em seus primeiros anos, também foi acusada de pirataria. Por isso, enfrentou muitos embates junto às grandes gravadoras. 

Porém, diferentemente de suas antecessoras, o Spotify migrou para um modelo híbrido. Ou seja, oferece música gratuita subsidiada pela publicidade de grandes anunciantes e uma versão premium paga pelo usuário, mediante assinatura mensal e sem qualquer tipo de propaganda. 

Aos poucos, o Spotify fez acordos com as gravadoras e disponibilizou espaço para a distribuição das músicas de seus artistas. Tudo isso, mediante o compromisso de pagar os direitos autorais devidos pelas visualizações dos usuários. É um modelo de sucesso que se tornou a base de novos negócios semelhantes, como Apple Music, Deezer, Amazon Music, dentre outras plataformas de streaming musical da atualidade.

Nesse novo paradigma, cabe o questionamento sobre o fim ou não da pirataria musical. Embora o streaming venha se consolidando como um meio legal de consumo de música digital, já existem algumas distorções. São identificadas algumas práticas consideradas violadoras dos direitos autorais, como o compartilhamento de contas de acesso premium que diminui a arrecadação de royalties.

Também há registro de outras condutas piratas. Criação de perfis falsos para se eximir do pagamento da assinatura, clonagem de contas pagas e compartilhamento ilegal de playlists com músicas protegidas por direitos autorais são alguns exemplos.

Todas essas violações autorais digitais ocorrem à medida que os usuários se apropriam da tecnologia e vão descobrindo falhas na segurança dos sistemas. Ou seja, uma clara demonstração de desprezo aos direitos dos autores. Não existe sistema inviolável, se a ética não limitar a ação humana.

Como se pode perceber, o problema da pirataria não é recente. Sua prática acompanhou a própria história mundial da música enquanto produto cultural de consumo. A questão é muito mais comportamental e social do que tecnológica. 

Do ponto de vista econômico, existe um embate histórico entre a sociedade e a indústria da música. Há uma exclusão por completo da perspectiva central do autor como origem de toda a criação musical. Enquanto assim for, vamos continuar convivendo com novas e diferentes formas de pirataria, desafiando progressivamente toda a lógica da cadeia musical.

Saiba mais sobre pirataria e direito autoral nos cursos da Powerjus.

abril 27, 2023 0 Comente
0 FacebookTwitterPinterestEmail
A imagem apresenta o símbolo do copyright. Para exemplificar o tema 20 perguntas e repostas sobre o Direito Autoral.
DireitoTecnologia

20 perguntas e respostas sobre o Direito Autoral

de Elisângela Dias Menezes fevereiro 24, 2023
escrito por Elisângela Dias Menezes

Conhecimento jurídico não é apenas para profissionais da área e não deveria ser algo distante dos cidadãos. São informações essenciais para nossa rotina pessoal, social e profissional. Dentro das diversas áreas do Direito, encontramos a proteção das produções intelectuais. Algo fundamental nos dias atuais, com o aumento da produção autoral e de plataformas para disseminar estes conteúdos. Para auxiliar as pessoas imersas nesse universo, selecionei 20 perguntas e respostas sobre Direito Autoral.

Acompanhe este conteúdo e deixe nos comentários quais outras dúvidas você tem!

1) Afinal, o que é Direito Autoral?

Direito Autoral é aquele que protege os autores de criações intelectuais, artísticas e literárias. Isso inclui os compositores musicais, escritores, criadores audiovisuais, pintores, coreógrafos e quaisquer outros autores de conteúdo criativo analógico ou digital.

2) De onde surgiu o Direito Autoral?

O Direito Autoral surgiu com a evolução dos meios de comunicação. Seu marco inicial foi a criação da prensa de Gutenberg na Alemanha do século XVII. Ao permitir a reprodução de textos, essa máquina gerou a dúvida acerca do direito que caberia sobre as cópias. De lá para cá, o Direito Autoral evoluiu na Europa e nos Estados Unidos, de onde alcançou todo o mundo. Um tratado internacional de 1886, chamado Convenção de Berna, foi assinado pela maioria das nações, incluindo o Brasil, e passou a reger o Direito Autoral mundo afora.

A Obra autoral e sua proteção

3) O que é protegido pelo Direito Autoral?

Todo tipo de arte e texto é protegido pelo Direito Autoral, desde que tenha criatividade e valor estético. A dança, as artes circenses, os poemas, o repente e a literatura de cordel são alguns exemplos menos lembrados. Além disso, temos música, teatro, cinema, pintura, contos, romances, teses, dissertações e diversos tipos de obras já muito conhecidas do grande público.

4) Preciso registrar minha obra?

Não é preciso registrar a obra, necessariamente. O Direito Autoral nasce com a criação e independe de registro para ser reconhecido. Apesar disso, é muito importante obter prova confiável que atribui uma data de criação à obra. No caso de uma eventual disputa de autoria, será considerado autor aquele que há mais tempo usa a obra como sendo sua. Isso, sim, depende da apresentação de prova com data.

5) Onde posso registrar minha obra?

É possível registrar uma obra autoral de diversas formas, sempre com a intenção de atribuir uma data à criação e fazer prova de anterioridade de uso. Assim, é possível registrar a obra em qualquer cartório de registro de títulos e documentos, registrar junto à Fundação Biblioteca Nacional ou, ainda, registrar em um dos muitos sites que fazem registro via blockchain. Entre eles, se destaca o site da CBL, a Câmara Brasileira do Livro.

6) Pode haver criação autoral coletiva?

Sim, existem diversas modalidades de criação conjunta, que é quando as obras são criadas por mais de um autor. Na coautoria, os autores têm peso igual na criação. Na colaboração, um autor é o principal e o outro tem participação secundária. Nas obras coletivas, há um organizador e diversos autores. Por fim, existem as obras compostas, que são aquelas que agrupam duas ou mais obras individuais. Em cada caso, os autores deverão combinar previamente entre si qual será a divisão percentual de participação autoral nos lucros obtidos com a obra.

7) Existe obra autoral sem autor?

Toda obra tem um autor, e ele é sempre uma pessoa humana. Empresas ou outras instituições podem ser titulares de direitos, mas nunca autoras. Por outro lado, existem obras cujos autores são desconhecidos ou não identificados, pois se apresentam sob pseudônimos/apelidos. Para usar esse tipo de obra, deve-se indicar que o autor é desconhecido. Caso tal autor apareça posteriormente e consiga provar a autoria, poderá suspender o uso feito anteriormente à sua identificação.

Conteúdo do Direito de Autor e seus limites

8) Que direitos o autor tem?

O autor tem direitos morais e patrimoniais sobre sua obra. O direito moral é o direito de crédito e é eterno. Ainda que a obra circule e tenha vários donos (titulares), a autoria se manterá inalterada e o autor deve ser sempre creditado. Já o direito patrimonial é o direito econômico: direito de cobrar pelo uso da obra, de comercializá-la no mercado. Ele perdura por toda a vida do autor e ainda pertence aos herdeiros pelo prazo de 70 anos contados da morte do autor. Significa dizer que, durante toda a vida do autor, ele poderá lucrar com sua obra e, após a sua morte, os herdeiros passarão a administrar esses direitos pelo prazo de 70 anos.

9) O que é o domínio público?

Domínio público é o prazo estipulado em lei para o uso livre das obras autorais, tendo em vista a extinção dos direitos patrimoniais de autor. Uma obra cai em domínio público 70 anos após a morte do autor. Significa dizer que, a partir daquele momento, os herdeiros do autor falecido não podem mais cobrar pelo uso da obra. Ela passa a ser de uso livre, inclusive para edição, tradução ou adaptação. Nesse caso, a única exigência é de que o interessado cite a autoria da obra original, em respeito aos direitos morais do autor.

10) Existem usos autorais livres?

Na verdade, existem poucos usos autorais livres. A lei de direitos autorais chama esses usos de limites ao direito de autor, permitindo:

  • citação literária, desde que identificado o autor;
  • informação da imprensa;
  • uso de obras para fins educativos;
  • criação de paródias (crítica artística);
  • uso de obras no recesso familiar (uso caseiro).

Se a obra estiver visível na rua, também poderá ser fotografada, filmada ou desenhada. Fora essas raras exceções, os demais usos dependem de autorização prévia feita por escrito ou filmada. 

Direitos conexos e defesa autoral

11) Como fica o direito dos artistas?

O artista é aquele que interpreta uma obra autoral. Pode ser um músico, um cantor, um ator ou um bailarino. Segundo a lei de direitos autorais, os artistas têm direitos equiparados aos dos autores, incluindo sobre suas interpretações. O direito dos artistas é chamado de direito conexo e beneficia também os produtores fonográficos (produtores de músicas) e as empresas de radiodifusão (rádios).

12) Quais as principais infrações aos direitos de autor?

As infrações mais comuns aos direitos dos autores são: contrafação, pirataria, reprografia e plágio. A contrafação compreende todo uso não autorizado de obra autoral alheia. Por sua vez, quando esse uso gera cópias para venda massificada, então teremos a prática ilegal de pirataria. Já a reprografia é a reprodução ilegítima por meio de máquinas copiadoras. Por fim, o plágio é a falsa atribuição de autoria, pelo qual um terceiro toma para si partes de uma autoria alheia, alegando tê-las criado.

13) Como o autor pode se defender?

Na defesa privada dos seus direitos (esfera cível), o autor pode notificar extrajudicialmente o ofensor acerca de seus direitos, determinando as medidas necessárias para cessar a violação. Ele também pode processar o malfeitor, pedindo indenização por danos morais e materiais em função do ato ilícito. É viável também solicitar uma possível retratação (pedido de desculpas) ou mesmo o direito de resposta. Já no aspecto coletivo e público (esfera penal), o autor pode prestar queixa numa delegacia de polícia e dar início a uma investigação. Como existe o crime de violação de Direito Autoral (artigo 184 do Código Penal), a ação pode culminar com a prisão ou uma medida socioeducativa contra o agressor.

Associações de gestão coletiva e Contratos autorais

14) O que é o Ecad?

Ecad é a sigla para Escritório Central de Arrecadação de Direitos Autorais. Trata-se de uma entidade que arrecada direitos autorais em nome dos autores filiados a uma das sete associações que a compõem: Abramus, Socinpro, UBC, Amar, Sbacem, Assim e Sicam. Assim, o Ecad é um órgão de representação privada dos autores que, ao se filiarem a uma dessas associações, automaticamente conferem poderes a ele para cobrar direitos autorais em seu nome.

15) Quais são as modalidades de comércio (exploração econômica) da obra?

Ao autor ou titular de direitos autorais é possível autorizar o uso de uma obra (licença de uso) ou vendê-la, transferindo todos os direitos para um terceiro (cessão de direitos). Existe ainda o contrato de edição. Por meio dele, o autor permite que uma empresa explore determinada obra especificamente naquele segmento, como a edição literária ou musical.

O Direito de Autor Digital

16) O que mudou no Direito Autoral com a internet?

A internet fez com que as obras autorais circulassem em velocidade tão acelerada, que ficou quase impossível controlar quem tem a posse sobre o quê. Muitas das obras que tinham suporte exclusivamente material passaram a ter versão digital, como pinturas, música e filmes em vídeo. Surgiram novas formas, todas online, de comercializar obras autorais e houve uma popularização do processo criativo. Tudo isso, enquanto muitas pessoas se tornaram produtoras de conteúdo e, portanto, autoras.

17) Como produzir prova de direitos autorais na internet?

Na era digital, há ferramentas já bem-aceitas para produção de provas pela própria internet. Os registros via blockchain (cadeia de dados das criptomoedas) facilitou o cadastro de arquivos, páginas, vídeos ou telas de redes sociais. Até os cartórios se adaptaram e passaram a promover registros digitais por meio das chamadas atas notariais.

18) Quem é responsável por violações na internet?

A velha ideia de que a internet é terra de ninguém já caiu por terra. A Constituição Federal proíbe o anonimato e isso vale também para o ambiente virtual. Atualmente, há recursos tecnológicos e legais para rastrear os violadores digitais e puni-los. Além dos dispositivos de segurança de rede e de dados, existe a legislação de crimes cibernéticos. Por fim, se os responsáveis pela infração não forem localizados, é possível solicitar judicialmente que a própria plataforma ou rede social tire do ar o conteúdo ilegal. Caso contrário, podem arcar com os custos de uma eventual indenização.

19) O que é o streaming?

O streaming é a nova forma de disponibilização de obras autorais na internet. Trata-se da tecnologia que permite ao usuário desfrutar de uma obra artística por meio de uma conta gratuita ou paga. Tudo isso, sem precisar “baixar”, ou seja, fazer o download do conteúdo. Exemplos de serviços de streaming famosos são Netflix, Globoplay, Spotify e YouTube.

20) Como fica o Direito Autoral com a chegada da inteligência artificial?

Vivemos a era dos robôs, algoritmos, chatbots e outros mecanismos de automação de operações antes reservadas aos seres humanos. Com isso, a discussão chegou ao campo do Direito Autoral. Afinal, tem havido investimentos em máquinas capazes de criar obras artísticas, a partir de um complexo conjunto de comandos computacionais. Já há casos de pinturas, textos, vídeos e músicas criadas integralmente por meio de inteligência artificial. De quem seriam os direitos sobre essas criações? Tendo em vista que, legalmente, o autor é sempre uma pessoa humana, o debate sobre esse tipo de autoria segue acalorado e sem solução. Vale acompanhar as tendências e desdobramentos para se manter atualizado.

Conhecer o Direito Autoral permite que diversos profissionais sejam mais efetivos ao gerenciar sua produção e carreira. Afinal de contas, estamos falando de formas de proteger, divulgar e administrar sua obra intelectual. São informações importantes para diferentes nichos, de escritores a influenciadores digitais ou programadores.

Gostou deste conteúdo? Compartilhe com outras pessoas!

Veja também:

ChatGPT? Revolução ou perigo?

Propriedade intelectual sobre conhecimentos tradicionais

Acompanhe minhas redes sociais:

Instagram, Facebook, LinkedIn e YouTube

fevereiro 24, 2023 0 Comente
0 FacebookTwitterPinterestEmail
Propriedade intelectual sobre conhecimentos tradicionais - Arte Indígena Waurá
BusinessDireitoProperty & Finance

Propriedade intelectual sobre conhecimentos tradicionais

de Elisângela Dias Menezes janeiro 30, 2023
escrito por Elisângela Dias Menezes

Propriedade intelectual sobre conhecimentos tradicionais, o que os empreendedores precisam saber?

Sabe aquela receita ou dica infalível do tempo da sua avó? Pois é, isso tem nome. Os chamados “conhecimentos tradicionais” têm grande valor e representam um baita desafio para o campo da Propriedade Intelectual.

Podemos defini-los como o conjunto de conhecimentos vivos, em constante construção e aprimoramento, gerados e transmitidos dentro das comunidades. Além disso, que vão construindo a cultura, a tradição e a história locais.

Os conhecimentos tradicionais são muito amplos. Eles abrangem, dentre outras matérias, práticas, técnicas, saberes adquiridos pela experimentação, aptidões e inovações surgidas no seio de suas respectivas comunidades. Tais conhecimentos têm reflexos únicos na interação social local com o meio ambiente. Da mesma forma, nas práticas relacionadas à agricultura, saúde e educação, dentre outros campos, representando verdadeiros ativos intelectuais de seus grupos de origem.

Além disso, há um tipo específico de conhecimento tradicional que merece especial destaque: o folclore e as manifestações culturais. Assim, têm direito também a esse título não só as lendas, os rituais e as tradições locais, mas também as práticas artísticas próprias daquela comunidade. Por exemplo, músicas, danças, desenhos, símbolos, encenações, execuções e performances em geral.

Embora claramente representem ativos intelectuais passíveis de proteção coletiva, os conhecimentos tradicionais ainda não são protegidos por leis específicas no campo da propriedade intelectual. A própria Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) reconhece a sua importância. Ela tem se esforçado para promover estudos e debates acerca da proteção internacional da matéria.

Uma regulação jurídica para os conhecimentos tradicionais seria muito importante para unificar o conceito a respeito do tema. Ela também é fundamental para definir, de forma objetiva, a titularidade dos direitos decorrentes de sua proteção.

Para isso, outros pontos desafiadores precisam ser enfrentados. Por exemplo, a definição dos direitos aplicáveis em cada caso e sua harmonização com os demais campos da propriedade intelectual. Além disso, as exceções necessárias e a solução para reivindicações concorrentes entre as diversas comunidades.

Propriedade intelectual sobre tradições e cultura nacionais

De fato, a proteção dos conhecimentos tradicionais em muitos pontos pode colidir com outros registros intelectuais. No campo das marcas, por exemplo, se uma expressão cultural for registrada a esse título, a exclusividade atribuída ao nome registrado acabaria impedindo que outras pessoas o utilizassem, gerando um indesejável monopólio.

Já na área dos direitos autorais, o dilema está na questão da autoria. Fato é que haverá sempre a proteção da autoria individual de obras artísticas, cujos autores possam ser identificados. Isso, mesmo que tais obras tenham valor cultural tão relevante e tão consolidado, que possam ser consideradas parte integrante de um determinado acervo de conhecimentos tradicionais.

As associações de produtores locais também precisam estar conscientes de que os conhecimentos tradicionais são diferentes das indicações geográficas. Essas últimas representam o registro coletivo perante o INPI de produtos típicos da região.

De fato, pode ocorrer o registro de uma indicação geográfica por conta do desenvolvimento local de um conhecimento tradicional. Porém, esse registro não substitui nem se sobrepõe ao seu conhecimento de origem.

Por sua vez, os designers de produtos, normalmente titulares de registros de desenhos industriais, precisam identificar o que é inovação de caráter comunitário, coletivo e tradicional. Tudo isso, sem impactar negativamente nos direitos da comunidade por conta de um eventual pedido de registro de desenho industrial amparado em conhecimentos tradicionais.

Qual o impacto de toda essa discussão no empreendedorismo? Sem dúvida, é preciso pensar em como os empresários e produtores culturais podem promover a cultura ou produzir peças, sem agredir os direitos de comunidades tradicionais.

O primeiro passo é conhecer, identificar e valorizar tais práticas e a cultura local. Dessa forma, reconhecer os conhecimentos tradicionais e buscar preservá-los enquanto tal. Só uma sociedade amadurecida quanto ao senso de coletividade consegue priorizar os direitos da comunidade em detrimento da sua ambição.

Encaradas como ambiente social e criativo, as comunidades e seus conhecimentos tradicionais contribuem para o desenvolvimento do país. Assim, resgatam e perpetuam a história. Da mesma forma, servem como cenário para pesquisas, trocas e aprendizado coletivo rumo à evolução social.

Finalmente, é importante mapear, acompanhar e contribuir para as discussões jurídicas a esse respeito no país e no cenário internacional. Isto é, num esforço conjunto para proteger, tanto na esfera individual quanto coletiva, o que é memória, história, cultura e tradição em nossa nação.

Veja também:

Direito para empreendedores: transforme seu negócio

Produto digital autoral – entenda o que é isso

Acompanhe minhas redes sociais:

Instagram, Facebook, LinkedIn e YouTube

janeiro 30, 2023 0 Comente
0 FacebookTwitterPinterestEmail
Pirataria, plágio e outras violações autorais
BusinessDireito

Pirataria, plágio e outras violações autorais

de Elisângela Dias Menezes outubro 24, 2022
escrito por Elisângela Dias Menezes

Com assustadora rapidez e precisão, a tecnologia tem ampliado cada vez mais as possibilidades de transmissão, execução, exibição e reprodução das obras autorais. Softwares e aplicativos cada vez mais tecnológicos, atualmente, reproduzem, editam, traduzem e transformam obras autorais preexistentes de forma simples e rápida.

Infelizmente, porém, o desenvolvimento da tecnologia não obedeceu aos padrões éticos e legais de conduta esperados dos cidadãos e das instituições. Não há nenhum controle sobre tais condutas nem sobre a distribuição digital das obras produzidas por semelhante tecnologia.

Violações autorais

Muitas são as formas de violação ao Direito de Autor. As mais famosas são aquelas conhecidas pelos nomes de pirataria, contração, reprografia e plágio. Cada uma delas tem especificidades ditadas pela lei, pela doutrina e pela própria jurisprudência.

Toda vez que uma obra autoral é utilizada sem a autorização do titular, o responsável incorrerá em violação ao Direito de Autor. Para isso, não importa se a finalidade do uso é lucrativa ou não. O fim comercial apenas agrava o desrespeito aos direitos patrimoniais de autor.

Além disso, toda vez que se omite ou usurpa a autoria de uma obra, lesa-se a moralidade do autor. Igualmente, quando se modifica o seu conteúdo, rouba-se-lhe o direito de integridade. Quem perde em primeiro lugar é sempre o autor. Depois, as empresas que vivem da exploração da arte. Por fim, a própria sociedade, a qual, mediante o desrespeito à sua produção intelectual, tornar-se vítima da incultura.

Pirataria

A pirataria pode ser concebida como o ato de copiar obra para fins de comercialização ilegal ou para uso pessoal. Isso, sem autorização do autor ou sem respeito aos direitos de autoria e cópia. Aqui, trata-se de cópias físicas ou digitais. São muitos os motivos que parecem favorecer esse tipo de prática. Do ponto de vista jurídico, falta fiscalização e repressão por parte dos agentes públicos.

Falta também iniciativa dos autores, no sentido de promoverem as respectivas ações judiciais. Ações essas que não só punam os responsáveis, mas também sirvam de exemplo para desencorajar novas violações. Por fim, à própria legislação falta eficácia no sentido de coibir a pirataria. Isso, tanto por causa da brandura das sanções previstas quanto pela ausência de regulamentação específica sobre as novas tecnologias.

Contrafação

Já no que se refere à contrafação, a definição vem da própria lei autoral. Trata-se simplesmente da reprodução não autorizada. Para grande parte dos autores, o termo seria sinônimo de pirataria. Com efeito, ambos se traduzem pelo uso de obra intelectual sem a devida autorização de seus titulares.

Mediante análise, porém, das definições legais, percebe-se que a contrafação é mais abrangente do que a pirataria. Essa última refere-se apenas às obras autorais. Já a contrafação, segundo legislação internacional sobre a matéria, pode ser caracterizada também quando da utilização ilegal de marcas (artigo 61 do Acordo TRIP’s sobre a proteção intelectual relacionada ao comércio).

Reprografia

A reprografia, por sua vez, é a prática de realizar cópias idênticas, feitas por meio de máquinas (ou softwares) capazes de reproduzir fielmente imagens e textos. Sua prática, quando realizada sem autorização dos titulares de direitos, constitui vertente da pirataria voltada especificamente para o mercado editorial.

A chamada reprografia autoral popularizou-se exatamente como a prática das cópias xerográficas, sem qualquer espécie de autorização. Elas violam não só os direitos dos autores dos livros, mas também dos editores ou outros titulares de direitos patrimoniais.

Hoje, fala-se do problema dos PDFs dos livros, que circulam de forma indiscriminada na Internet. Isso afeta os direitos das editoras e distribuidoras literárias e viola, inclusive, a exclusividade econômica dessas empresas sobre o livro digital, o chamado e-book.

Plágio

A seu tempo, o plágio pode ser definido como a reprodução dos elementos criativos de obra de outrem, conjugada com a usurpação de paternidade. Mesmo que apenas parcial ou levemente disfarçada.

Quem usa trechos de obras de outrem, sem lhes atribuir a devida autoria, comete plágio. Inclusive, não é necessário que se trate de uma reprodução fiel, bastando a apropriação dos chamados “elementos criativos”. Esses últimos representam o conjunto de características que tornam uma obra original, desde a sua linguagem até a construção estética e estilo próprio do autor.

Assim, a obra plagiadora sempre remete seu interlocutor à obra plagiada. Observa-se, entre ambas, algum tipo de identidade. Ela tanto pode se dar na linguagem quanto em qualquer elemento da forma estética.

Falta ao autor plagiador, a necessária criatividade – e a ética – para idealizar obra de estilo próprio, independente e única em seu formato, em sua significação e articulação.

Vale lembrar que o  Direito de Autor, enquanto instituto jurídico autônomo e independente, tem tutela própria. Ela é alicerçada em sanções de natureza cível e penal imputáveis a quem violar esse tipo de direito.

Na esfera cível, a própria lei autoral estabelece uma série de medidas que buscam não só a reparação econômica pelo mal causado. Ela define, principalmente, a cessação imediata do dano e a coibição de novas práticas abusivas.

O Código Penal tem dois artigos que cuidam especificamente dos crimes autorais, prevendo pena de reclusão para as práticas ilegais com objetivo de lucro. Finalmente, destaca-se que a própria Constituição Federal assegura prerrogativas aos autores intelectuais. Nesse sentido, qualquer ato de violação aos direitos de autor será ato de desrespeito às próprias garantias individuais expressas na Carta Magna.

Veja também:

Os direitos morais de autor como direitos da personalidade

Proteção autoral: saiba como registrar a sua obra

Ei, psiu! Precisamos falar da cópia de desenhos industriais

outubro 24, 2022 0 Comente
0 FacebookTwitterPinterestEmail
Chiquinha Gonzaga - da música ao Direito Autoral
Direito

Chiquinha Gonzaga, da música ao Direito Autoral

de Elisângela Dias Menezes outubro 17, 2022
escrito por Elisângela Dias Menezes

Vamos comemorar o Dia da Música Popular Brasileira? A data não foi escolhida por acaso! 17 de outubro, marca o nascimento de Chiquinha Gonzaga, responsável por moldar a música e a cultura brasileira. A artista estava à frente do seu tempo, mostrando a desigualdade racial, de gênero e quando o assunto era direitos autorais de artistas. Você sabia disso? Vamos conversar sobre Chiquinha Gonzaga, da música ao Direito Autoral.

Acompanhe!

Transgressões femininas

 Filha de uma mulher negra alforriada e um rígido militar, Francisca Edwiges Neves Gonzaga nasceu no Rio de Janeiro, em 17 de outubro de 1847.  Sua educação seguiu uma linha tradicional. Começou a ter aulas de piano desde criança e realizar apresentações em casa para familiares e amigos dos seus pais.

Chiquinha casou aos 16 anos. Seu marido, escolhido por ser pai, enxergava o piano como um rival, situação que acabou desgastando a relação. 

Em uma época em que mulheres não tinham voz ou direitos, Chiquinha teve seu primeiro embate social. Afinal, ela abandonou o casamento para viver ao lado de João Batista de Carvalho. Seu marido moveu uma ação judicial de divórcio perpétuo, no Tribunal Eclesiástico, por abandono do lar e adultério.

Contribuições históricas para a música brasileira

A relação da mulher com a música era reservada a esfera privada, dos lares. Chiquinha mostrou talento, coragem e determinação ao se profissionalizar na música.

Foi a primeira mulher à frente de uma orquestra. Na época, a imprensa não sabia como se referir a ela, já que não tinha palavra feminina para esse cargo. Ao longo da carreira como maestrina, Chiquinha musicou peças de teatros de gêneros variados.

Chiquinha regeu um concerto de violões, promovendo um instrumental até então estigmatizado. Envolvida nas questões sociais da época, Chiquinha vendia partituras de porta em porta para angariar fundos para a Confederação Libertadora. Com dinheiro, comprou a alforria de José Flauta.

Em 1899, Chiquinha compôs a marchinha de carnaval “Ó Abre Alas”, um marco da música brasileira que atravessou gerações.

Chiquinha Gonzaga, da música ao Direito Autoral

Durante uma temporada na Europa, atuando como compositora de partituras para o teatro, Chiquinha deparou-se com suas obras sendo comercializadas sem sua autorização. 

Ao retornar para o Brasil, a artista resolveu atuar pela causa dos Direitos Autorais, sendo uma das fundadoras da Sociedade Brasileira de Autores Teatrais (Sbat). Em uma época diferente da nossa, quando o assunto é proteção autoral, encontramos esforços de artistas para cuidar da sua produção intelectual.

Apesar da sua grande importância para a música e a cultura brasileira, Chiquinha enfrentou grande preconceito. Porém, é inegável sua contribuição para os rumos da música propriamente brasileira.

Viva Chiquinha Gonzaga! Viva a heroína da música brasileira!

Veja também:

Proteção autoral: saiba como registrar a sua obra

Entenda a disputa judicial de Roberto Carlos e Erasmo contra gravadora

outubro 17, 2022 0 Comente
0 FacebookTwitterPinterestEmail
A dança como expressão de arte autoral.
Direito

A dança como expressão de arte autoral

de Elisângela Dias Menezes outubro 10, 2022
escrito por Elisângela Dias Menezes

Pouco se fala sobre a proteção autoral das obras de dança. Os coreógrafos e bailarinos vão, gradualmente, desenvolvendo a consciência autoral de sua arte. Isso porque estão preocupados com fomento, disseminação, reconhecimento e valorização dessa modalidade artística, não só pelo Poder Público, mas também pelas instituições privadas e o terceiro setor.

O que observo, com grande pesar, é a ausência de estímulos para que a sociedade reconheça a proteção dos direitos desses profissionais como criadores e/ou intérpretes artísticos.

Nota-se, nesse sentido, que ainda são poucos os fóruns de discussão oficiais. Por exemplo: as câmaras setoriais do Ministério da Cultura ou mesmo os projetos e iniciativas das diversas associações do setor espalhadas pelo país.

Dança e Direito Autoral

A criação de dança é, sem dúvida, uma das mais belas modalidades autorais. São corpos e mentes que falam por meio de gestos, movimentos, expressões e sons. Produzidos sob luzes, cores e formas que dignificam a arte brasileira, destacando-a perante o resto do mundo.

Tamanha originalidade não pode dispensar a proteção da lei e o reconhecimento da sociedade. Afinal, sua própria grandeza imputa-lhe parcela de responsabilidade pela identidade cultural da nação. 

Assim, certamente, o autor de dança tem todos os direitos morais e patrimoniais decorrentes de sua criação. O exercício de tais prerrogativas não depende de registro. Porém, é necessário que haja órgão capaz de fazê-lo de maneira eficaz para que os criadores façam prova de sua autoria perante terceiros.

Como registrar coreografias?

Aí reside um grande desafio. Como registrar uma coreografia? Por meio de um texto descritivo ou de um vídeo? Ao fazê-lo, o autor não estaria criando outra modalidade de obra (literatura ou audiovisual)? A verdade é que a coreografia fala por si e, ao ser executada no palco, ganha vida e produz registro de existência e originalidade por si mesma.

Os bailarinos, como artistas intérpretes, e pela lei titulares de direitos conexos aos de autor, deverão ser respeitados quanto à fixação de suas respectivas imagens. Hão de ser reconhecidos como os responsáveis pela execução artística, que materializa a dança. Ou seja, a concretizam como expressão cultural de movimentos e gestos únicos, originais, capazes de criar significação própria.

Sem os intérpretes, a arte da dança, assim como outras em movimento, seria apenas uma ideia manifesta no mundo, mas nunca executada em sua forma original.

Além disso, atualmente se fala muito na criação coletiva, na participação autoral do bailarino como co-criador intelectual. Seja em co-autoria, seja em colaboração, a cada profissional da Dança será garantido o direito sobre sua parcela de contribuição para a obra artística. Se a criação é coletiva, todos serão, portanto, co-autores do resultado gerado.

A imaterialidade, o subjetivismo e a sutileza caracterizam a criação em dança. Espera-se que sejam conservados e respeitados como traços característicos e marcantes desse tipo de obra autoral. Entretanto, nunca, em tempo algum, como elementos impedidores de sua tutela.

Fala-se, aqui, da defesa levada às últimas consequências. Isso desde o campo da simples troca de ideias nos debates, passando pela segurança jurídica de contratos bem formulados e seguros, até chegar nas ações judiciais. Nessa etapa, se recorre, quando necessário, a fim de depositar nas mãos do juiz a responsabilidade pelo respeito autoral que a sociedade não conseguiu garantir.

Veja também:

Proteção autoral: saiba como registrar a sua obra

Entenda a disputa judicial de Roberto Carlos e Erasmo contra gravadora

outubro 10, 2022 0 Comente
0 FacebookTwitterPinterestEmail
Proteção autoral - saiba como registrar a sua obra
DireitoProperty & Finance

Proteção autoral: saiba como registrar a sua obra

de Elisângela Dias Menezes julho 1, 2022
escrito por Elisângela Dias Menezes

Se você é autor de obras artísticas e culturais e não sabe como registrá-las, você não está sozinho. Muitas são as dúvidas a respeito desse tema. 

Elas partem de criadores de obras artísticas reguladas pela Lei nº 9.610 de 1998, a chamada Lei de Direitos Autorais (LDA). Dentre elas:

  • textos (incluindo projetos e métodos);
  • músicas;
  • fotografias;
  • desenhos;
  • pintura;
  • audiovisual.

Entenda, a seguir, um pouco sobre a proteção autoral!

O direito autoral nasce com a obra 

Em primeiro lugar, é preciso entender o direito autoral como o conjunto de direitos que o criador tem sobre suas obras artísticas e culturais. Ao contrário do que se imagina, não é preciso registrar uma obra autoral para ser considerado autor.

O Direito de Autor nasce com a própria criação (e exteriorização) da obra. Quando a obra ganha corpo no mundo, em algum suporte ou formato, passa a ter uma existência real. A partir desse momento, ela merecerá a proteção da lei. 

Presunção de autoria 

Não há necessidade de qualquer registro para a aquisição de direitos autorais. O próprio texto do artigo 18 da Lei Autoral (Lei 9.610/98) dispõe categoricamente que a proteção independe de registro. 

De fato, o autor não precisa de documento público ou particular que lhe resguarde a condição de criador. Basta que crie para ser presumido autor. Esse é um dos princípios da lei: presume-se autor aquele que cria e anuncia a sua autoria. Mas se trata de uma presunção relativa, que pode ser derrubada por outro autor. Isso caso ele prove que já tinha aquela obra como sua em data anterior àquela anunciada para a criação. 

Anterioridade 

A lógica da autoria de obras artísticas é a da anterioridade. Ou seja, quem tem a obra autoral como sua há mais tempo, será considerado o seu criador. Nesse sentido, a atribuição de uma data à criação é essencial. Ela se torna um marco inicial do exercício dos direitos de autor e uma maneira de identificar quem de fato é o criador. Ou seja, aquele que tiver o uso mais antigo associado à obra. 

Registro como meio de prova 

Embora o registro autoral não constitua a autoria da obra, ele é essencial nessa atribuição de data, a fim de garantir a autoria. Assim, o registro é um importante meio de prova, que, não obstante tenha valor relativo, ajuda a garantir os direitos do autor perante terceiros. 

Se o autor se cercar de provas que contenham a data da criação, impedirá que qualquer usurpador se apresente posteriormente como criador da obra. Trata-se de uma garantia aos interesses do autor. 

Assim, caso seja questionado em sua condição de criador, o titular poderá apresentar o registro. Ele valerá como documento capaz de vincular a sua autoria a uma determinada data, obrigando que a outra parte prove a anterioridade de uso. 

De fato, quem primeiro manifestou a obra no mundo, provavelmente a criou. Não existem criações idênticas e simultâneas. Dois autores, certamente, nunca vão exteriorizar sua expressão artística ou literária por meio de obras exatamente iguais. Isso mesmo que tratem de um assunto semelhante, sob uma mesma ótica e influência. 

Haverá sempre gestos, traços, palavras, sons, expressões ou outros elementos distintivos. Quem tardiamente se apresenta como autor, não fará jus a esse título, caso provada a existência anterior da obra pelas mãos de outra pessoa. 

Onde registrar as obras e quais são os órgãos tradicionais 

O artigo 19 da Lei de Direitos Autorais faculta ao autor registrar a sua obra, mediante solicitação ao que lá se define como “órgãos competentes”. Trata-se de instituições que há anos se prestam a esse papel. No entanto, sem serem oficiais ou exclusivas para essa finalidade. 

1. Música 

Conforme a natureza da obra intelectual, ela poderá ser registrada em diferentes órgãos. Praticamente, todos eles estão sediados no Rio de Janeiro. As partituras musicais, com ou sem letra, poderão ser registradas na Escola de Música da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). 

2. Textos e imagens 

Livros, revistas, poesias, discursos, roteiros e demais textos escritos poderão ser registrados no Escritório de Direitos Autorais da Fundação Biblioteca Nacional (EDA-BN). Atualmente, a entidade registra também desenhos, fotografias e outras imagens, além de cartazes e até design de website. Eles deverão ser remetidos pelo correio para arquivo e recebimento do protocolo de registro. 

3. Pintura e escultura 

Por sua vez, a Escola de Belas Artes da UFRJ registra as obras de desenho, pintura, gravura, escultura e litografia. Ela é responsável também pelo registro das obras fotográficas e das produzidas por qualquer processo análogo. Porém, desde que, pela escolha de seu objeto e pelas condições de sua execução, possam ser consideradas criações artísticas. O referido órgão realiza, ainda, o registro de obras de arte aplicada. Para isso, seu valor artístico deve ser dissociado do caráter industrial do objeto a que estiverem integradas. 

4. Audiovisual 

As obras cinematográficas e demais criações audiovisuais ficam a cargo da Agência Nacional do Cinema — ANCINE. Ela, inclusive, emite para essas obras o Certificado de Produto Brasileiro — CPB.   

5. Softwares e aplicativos 

Os programas de computador são considerados obras autorais, protegidos por lei própria: a Lei 9.609/98. Ela dispõe que o registro dos softwares poderá ser feito no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), o mesmo que registra as marcas e patentes. No entanto, assim como para as demais obras autorais, o registro é facultativo. 

6. Projetos técnicos e profissionais 

Por fim, os projetos técnicos, enquanto textos científicos e, portanto, autorais, deverão ser registrados nos respectivos conselhos de classe. Projetos concernentes a Agronomia, Engenharia, Geografia, Geologia e Meteorologia deverão ser registrados no Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CONFEA). Já o registro dos projetos de Arquitetura e Urbanismo fica a cargo do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR).

Quais são outras opções de registro 

Para além dos órgãos oficiais de registro, muitos autores relatam interessantes iniciativas para a proteção de sua propriedade intelectual, igualmente válidas enquanto meio de prova relativo. A maioria delas refere-se às letras e partituras musicais, roteiros, argumentos cinematográficos, poesias e demais textos. 

O registro de tais escritos em cartório comum, de títulos e documentos, garante a fé pública e atribui uma determinada data às referidas criações. Outra iniciativa é o uso dos Correios, por meio de envio de carta a si mesmo, contendo o documento a ser protegido. 

Nesse caso, dois pontos podem ser considerados para fins de prova de anterioridade de uso autoral. O primeiro é o lacre da correspondência, desde que inviolado. Já o segundo, o carimbo dos Correios, atestando a data de recebimento. 

O registro por blockchain 

Na era digital, o registro autoral também tem ganhado novos contornos. É cada vez mais comum a utilização de redes blockchain para produzir provas de autoria. 

A tecnologia pode ser definida como uma cadeia de dados criptografados que circulam na internet de forma descentralizada e inviolável. Ela surgiu para a emissão de criptomoedas, como a bitcoin e o etherium. Porém, o sistema se presta a múltiplas utilizações, dentre as quais se destaca o registro de obras autorais. 

Várias empresas brasileiras ligadas à inovação (startups) já oferecem o serviço de registro autoral por blockchain. Avctoris, InspireIP e Authora são alguns exemplos. A própria Câmara Brasileira do Livro passou a oferecer o registro autoral por blockchain. A CBL é o órgão encarregado da emissão de ISBN (código internacional de catalogação dos livros).

Como registrar por blockchain

Os sistemas de registro de obras intelectuais por blockchain utilizam basicamente o mesmo procedimento. O interessado indica o arquivo a ser registrado, que pode ser vídeo, áudio, imagem ou texto, normalmente em qualquer extensão.

Com o arquivo, serão solicitados dados básicos da obra, como autoria e/ou titularidade de direitos, e um breve descritivo do que ela trata. Uma vez preenchidos os dados na plataforma, o interessado paga a taxa cobrada pelo sistema. 

Na mesma hora, ele recebe um certificado com o código hash (código de criptografia) de inserção daqueles dados na cadeia de blockchain. Junto a ele, estará o dia e horário em que o registro foi realizado.

Dúvidas e controvérsias do registro por blockchain

Apesar da simplicidade, rapidez e economia do registro por blockchain, no meio jurídico tradicional ainda existe alguma resistência à sua utilização. Isso porque não se trata de um sistema oficial e que ainda não há uma validação desse tipo de prova junto ao Poder Judiciário. 

De fato, ainda não há um número expressivo de decisões judiciais que reconheçam os registros autorais por blockchain como prova válida. No entanto, à medida que as tecnologias digitais vão se popularizando, eles se tornarão tendência.

Outra limitação apontada pelos autores a esse sistema é o fato de o conteúdo da obra (arquivo digital) ser criptografado. Dessa forma, se torna inacessível, o que dificultaria o seu reconhecimento para fins de constatação de violação.

Cabe ao autor guardar o certificado de registro com o arquivo, de modo a promover essa associação. Afinal, o certificado sozinho trará de forma visível apenas o nome do arquivo e a declaração de seu conteúdo. De toda maneira, é inegável que o registro por blockchain chega para facilitar, automatizar e popularizar o registro autoral. Especialmente das obras digitais, abrindo novas possibilidades aos autores intelectuais numa sociedade cada dia mais tecnológica.

Veja também:

Projeto cultural precisa de assessoria jurídica

Como produzir prova de violação de direitos na internet?

julho 1, 2022 0 Comente
0 FacebookTwitterPinterestEmail

Categorias

  • Business (28)
  • Curiosidade (4)
  • Direito (39)
  • Direito Autoral (4)
  • Direito na internet (4)
  • Empoderamento Jurídico (1)
  • Empreendedorismo (2)
  • Family & Personal (2)
  • Notícias (9)
  • Property & Finance (5)
  • Propriedade Intelectual (6)
  • Tecnologia (20)
  • Uncategorized (1)
  • Vídeos (3)

Redes Sociais

Facebook Instagram Linkedin Youtube

Postagens recentes

  • Direito de Imagem e Deepfakes: como se proteger da manipulação digital

  • Gestão de carreira para artistas e criadores digitais: quais são os principais desafios jurídicos?

  • Direitos Autorais na Era Digital: Como proteger e monetizar suas criações online

  • Net cidadão: a nova consciência digital e o papel jurídico na construção de um ambiente online mais responsável

  • Vamos falar sobre conformidade em Projetos Culturais?

@2022 Elisângela Dias Menezes - Todos os direitos reservados

Elis.Adv
  • Home
  • Sobre
  • Atuação
  • Meus livros
  • Blog
  • Depoimentos
  • Contato